BRICS as a Bricks (…Como Tijolos) Lado B

Músicos de diferentes culturas tocam instrumentos tradicionais sentados sobre blocos coloridos, representando os BRICS como uma sinfonia global em construção.
Na sinfonia dos tijolos, o som não vem só dos instrumentos, mas das diversas diferenças que tentam tocar no mesmo compasso, aqui os tijolos de montar são regulares, pois um quesito inusitado deixam todos iguais como você poderá ver no decorrer da matéria
ilustração: Athena&PLW [colagens digitais]

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Introdução

Quando o bloco vira obra de arte… ou obra inacabada?

O Lado B da bolacha dos BRICS as a Brick, desmonta contradições com humor e cuíca crítica — a esperança de que consigamos isso… nunca morre.

Destaca avanços reais e expõe trincas no bloco que quer mudar as regras do jogo cujas regras outros querem e/ou tentam mudar.

No Lado A dessa bolacha (LP) em forma de artigo, vimos que os BRICS+ (ampliado) se parecem mais com um conjunto de tijolos-de blocos geoestratégicos coloridos e irregulares do que com uma construção sólida — ao som da música Trick as a Brick (cabeça dura como tijolo).

Agora, no Lado B, seguimos tocando a bolacha no canteiro de obras — vamos tentar entender como países tão díspares se juntaram, passando por cima de diferenças cruciais — e, mais importante, em nome do quê.
E o que mais surpreende: como conseguem chegar a resoluções conjuntas… sem votação.
Esse entendimento vai ganhando forma à medida que revisitamos a história do grupo, sua liga e motivações — e percebemos como os BRICS, agitando o Sul Global, mexem com os nervos (e os interesses) do G7.
A ponto do técnico dos EUA tentar mudar as regras no meio da partida, em busca de um home run solo.
É aí que entram o fair play econômico, o tal banco que não é Banco… dos BRICS (mas é), e — sim, de novo! — o tripé da sustentabilidade, que no caso dos BRICS, anda meio manco… mas de bengala verde.

Ampliação, pegada e descompasso

No Lado A, vimos que a entrada de novos membros e parceiros desafia o cambaleante tripé da sustentabilidade. Enquanto alguns países marcham firmes no pilar econômico, outros tropeçam no social ou ignoram o ambiental. Cada qual toca o que lhe é de direito, cítara, balalaica, cuíca ou ainda angklung indonésio, qanun e oud — estes dois últimos, correspondentes árabes a cítara e ao alaúde — mas nem sempre no mesmo compasso e muito menos no mesmo tom. Com mais vozes no coral, aumenta o risco de desafinar… mas também a chance de inventar uma nova harmonia.

E por aqui, no Conexões…

Com o ouvido atento ao som das obras. Nesse lado B da bolacha — ou seja, o outro lado da conversa — trazemos comparações curiosas, conclusões da cúpula, pegadas de carbono, ruídos diplomáticos e notas dissonantes sobre direitos humanos.

Porque se o mundo está Thick as a Brick — more than ever — cabeça dura como tijolo, mais do que nunca… talvez o jeito seja aprender a plantar verde até no concreto. Ou, pelo menos, colocar uns vasos em cima dele.

E tem mais: Os BRICS+ parecem um bloco econômico — mas não são. Parecem uma organização internacional — mas não são exatamente uma organização, embora sejam internacionais, sim. Seria um grupo homogêneo — isso não são mesmo! Soam como um bloco antiocidental — mas não são: apenas ladram quando pisam no calo. Parecem um clube fechado — mas estão plenamente abertos a negociações. Então, afinal… o que te parecem os BRICS+?

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O bloco original e seus encaixes difíceis

Do acrônimo BRIC ao agrupamento político

A sigla BRIC nasceu em 2001 no seio do sistema financeiro global — daí a hegemonia do econômico. Foi o economista Jim O’Neill, do banco Goldman Sachs, quem cunhou o termo para se referir a quatro países emergentes com grande potencial de crescimento: Brasil, Rússia, Índia e China.
Naquele momento, não se tratava de um grupo político, mas de uma leitura de mercado — quase uma sugestão para que investidores diversificassem suas apostas além do eixo Estados Unidos–Europa–Japão.

O conceito, no entanto, ganhou vida própria

A partir de 2006, os quatro países começaram a se reunir informalmente. Em 2009, aconteceu a primeira cúpula oficial, em Ecaterimburgo, na Rússia. Um ano depois, em 2010, a África do Sul foi convidada a se juntar ao grupo, transformando o BRIC em BRICS — com o S de South Africa.
(Nem todos imaginavam ou sabiam que o certo seria BRICZ — se você não sabe por quê e ficou curioso em saber clique aqui, no Lado A explicamos direitinho a origem e qual a sigla oficial da África do Sul como o do Brasil é BR… e também de algumas outras siglas nacionais, inclusive aquelas que aparecem como sufixo depois do .com.)

Se juntou a fome com a vontade de comer — então porque não ter um encontro anual?

Desde então, as cúpulas dos BRICS se tornaram anuais, ora em um país — ora em outro (sem furo) — as de 2021, 2022 e 2023 foram realizadas por vídeo conferência em plena pandemia. O grupo passou a desenvolver uma agenda própria, ainda que marcada por interesses divergentes e desconfianças mútuas. O que era um acrônimo jornalístico se transformou num bloco político heterogêneo, com ambições de reforma do sistema internacional — mirando instituições como o FMI, o Banco Mundial e o Conselho de Segurança da ONU.

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Infográfico colorido com fundo amarelo, três peças de quebra-cabeça no centro (verde, creme e roxa) simbolizando diversidade e união. Texto central destaca: “CONSENSO NO BRICS+: COMO É? — Numa resposta curta: POR CONSENSO”. Abaixo, explica que o princípio básico de decisão é a unidade na diversidade, com destaque para a frase: “Eu concordo!, junta! Eu não concordo
Uma regra com princípios democráticos surgida por… consenso
ilustração: Athena&PLW [colagens digitais]

A recente ampliação: novos membros e novos enigmas

Os BRICS dobraram as apostas ao dobrar os membros?

Em 2024, o BRICS surpreendeu ao anunciar sua primeira grande expansão, incorporando cinco novos países: Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, o dobro. Já em 2025, a Indonésia se juntou como membro pleno, agora onze.

 Além disso, mais dez países passaram a integrar o bloco na condição de parceiros de diálogo: Belarus, Bolívia, Cazaquistão, Cuba, Nigéria, Malásia, Tailândia, Vietnã, Uganda e Uzbequistão.

O que une esse novo BRICS?

  • O desejo comum de maior autonomia frente às potências ocidentais?
  • O peso energético dos membros do Oriente Médio?
  • O ressentimento histórico em relação ao colonialismo?

Talvez um pouco de tudo isso — mas, na prática, o bloco se torna ainda mais difícil de definir.

Agora abriga monarquias absolutistas e repúblicas democráticas, países em conflito e outros em crescimento acelerado, nações com forte presença religiosa e outras de tradição laica. É um mosaico de economias, regimes e ambições que desafia qualquer tentativa de síntese.

Essa expansão levanta perguntas incômodas:

  • Como tomar decisões entre tantos interesses conflitantes?
  • Como articular uma política ambiental comum diante de perfis tão distintos?
  • E como sustentar o discurso de um bloco do Sul Global com membros que se projetam regional ou globalmente por estratégias muitas vezes concorrentes?

Qual o segredo? Unidade na diversidade ou pacto de conveniências?

Como funcionam as decisões no BRICS?
Numa resposta curta:
POR CONSENSO.

Eis aí: as peças disformes — como na ilustração do início do artigo — ganham uniformidade, o mesmo tamanho e peso nas decisões, em todas as decisões.
Tudo só se encaixa quando todos dizem sim.

O princípio que atua ali é o mais básico da unidade na diversidade:

Eu concordo!, junta.
Eu não concordo!, desmancha.

Embora não seja uma regra ditada — hummm, uma regra com princípios democráticos surgida por… consenso —, o BRICS+ não tem um estatuto rígido. Foi com base nessa prática que o Brasil usou o consenso para barrar a entrada da Venezuela. Já os países que apoiam sua entrada seguem tentando negociações políticas. E a Rússia, por sua vez, defende a criação de uma alternativa ao dólar, mesmo que seja sem consenso no grupo.

É como montar um castelo com blocos no caso, geoeconômicos: qualquer peça que não encaixe naquele momento, sobre algum assunto, faz o conjunto parar.

Nada de segredo, portanto. Apesar da saroba — ou melhor, da peculiar diversidade entre os membros —, o grupo funciona por entendimento mútuo. Funciona democraticamente, ao seu modo.

Esse método garante que todos se sintam representados — mas também impõe um ritmo lento, condicionado à disposição de cada um em ceder algo.

Assim se dá a resposta mais longa: por uma diplomacia milimétrica, onde cada vírgula pode virar obstáculo. Se há eficiência, ou se atravanca o progresso das negociações… aí é outra história. O que pesa, muitas vezes, é uma espécie de pacto de conveniências — ou seja, flexibilizar uma decisão que seria contrária por algumas convicções, em nome da conveniência própria.

E CONSENSO PLENO:
Todos os membros precisam concordar. Um só país discordando — e a proposta não avança. Por enquanto e na grande parte do que sabemos funcionou assim, mesmo que haja esperneios e alguns olhares tortos nos bastidores.

Sem sistema de votação:
Diferente de organizações como a ONU (com vetos) ou a OMC (com quóruns), o BRICS funciona por entendimento mútuo, muitas vezes conquistado após negociações intensas nos bastidores.

A declaração final é um documento conjunto, onde cada palavra é escolhida como fosse figurar num tratado (e é), para garantir que ninguém se sinta desalinhado — nem exposto.

Quando há temas sensíveis ou divisões internas, entram em cena as fórmulas diplomáticas de sobrevivência, como:

Reconhecemos diferentes pontos de vista sobre…
Reafirmamos o respeito à soberania dos Estados e à diversidade de caminhos para o desenvolvimento…

E se não houver acordo algum?

Nem sempre o impasse aparece no noticiário. Quando não há consenso entre os países dos BRICS, o tema pode simplesmente… sumir. E aí começa o balé diplomático, que costuma seguir três movimentos bem ensaiados:

  1. Desaparece sem alarde
    O assunto não entra no comunicado final. Simples assim. Evita-se constrangimento e ninguém precisa brigar em público. A ausência já diz muito.
  2. Retorna camuflado
    Na cúpula seguinte, o tema reaparece — mas em linguagem mais abstrata, diluído em expressões como preocupações estrutural ou compromissos multilaterais. Fica escondido entre categorias genéricas.
  3. Volta no tempo certo
    Quando o clima muda — e os países que antes criavam barreiras já não se opõem — o assunto pode reaparecer com força. Mas agora repaginado, rebatizado, ou até com nova base de apoio. O segredo é esperar o momento certo e o vocabulário certo.

Exemplo?
A discussão sobre a reforma do Conselho de Segurança da ONU ilustra bem isso. Alguns membros dos BRICS (como Brasil, Índia e África do Sul) querem se tornar membros permanentes. Mas há divergências: China e Rússia, que já são permanentes com poder de veto, nem sempre demonstram entusiasmo com essa ampliação.

É aí que entra o G4 — um grupo formado por Brasil, Alemanha, Índia e Japão, que defende uma reforma concreta: ampliar o número de membros permanentes (mesmo que sem poder de veto).
A África do Sul também pleiteia um assento, mas por outra via — articulanda com a União Africana, que propõe duas cadeiras permanentes para países africanos, sem endossar exatamente o formato do G4.

Como nem todos concordam com essas propostas, o tema às vezes sai do radar — ou seja, desaparecer para reaparecer, olha eu aqui de novo…

A cúpula no Rio e o papel do Brasil como sede

A 16ª cúpula do BRICS aconteceu em julho de 2025, no Rio de Janeiro, marcando a presidência rotativa do Brasil num momento estratégico — e delicado.

Enquanto busca reforçar seu protagonismo internacional, o Brasil precisa conciliar múltiplas agendas: os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), os compromissos climáticos, a defesa da democracia — e, ao mesmo tempo, manter a harmonia com parceiros de perfis políticos e econômicos bastante distintos.

Nesta edição, Xi Jinping e Vladimir Putin não compareceram pessoalmente, mas enviaram representantes. No caso da Rússia, o gesto veio acompanhado de um vídeo de Putin, em que reiterou a defesa da desdolarização e da criação de um sistema independente de pagamentos, baseado em moedas locais.

Esses dois termos — desdolarização e moedas locais — foram os protagonistas da brincadeira do CES na criação do nosso tabloide fictício no Lado A: uma paródia da paródia partindo da capa do LP Thick as a Brick, do Jethro Tull. Ali, no Lado A deste artigo-saga (quase épico — pelo menos em tamanho, que nesse caso, também é documento), o pequeno José da Silva e o poeta mineiro Drummond (por ironia, na sua presença metálica na orla carioca) ganham vida em uma cena imaginária na praia de Copacabana.

E já que estamos falando em ficção, vale abrir (   )s para outra proposta que ronda os bastidores do bloco: a criação de uma moeda comum, apelidada (a princípio) de Unidade — nome que, aliás, parece saído de um livro de ficção científica, A UNIDADE. Por enquanto, no entanto, segue como ideia suspensa, à espera de um (olha ele aí) CONSENSO

Seguindo…

Putin também destacou que, em 2024, cerca de 90% das transações da Rússia com os países do BRICS já foram realizadas em rublos ou outras moedas nacionais — um dado que, embora expressivo, ainda enfrenta os limites de um sistema financeiro internacional fortemente dolarizado.

Ainda assim, não existe uma alternativa real ao dólar como referência global. O sistema financeiro internacional permanece fortemente dolarizado — o que, por ora, limita o alcance prático dessa ambição.

Mesmo assim, China e Rússia seguem liderando essa frente com motivações evidentes: reduzir os impactos de sanções econômicas e conter a influência ocidental sobre os fluxos financeiros globais.

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As pernas bambas no tripé da sustentabilidade nos BRICS

Quando o tripé manca: o econômico em desalinho

O conceito de desenvolvimento sustentável se apoia num tripé: social, ambiental e econômico. Mas, entre os BRICS e seus novos integrantes, esse tripé costuma tropeçar mais do que sustentar — seja por falta de opção ou, muitas vezes, de grana.

Por esses ou outros motivos, alguns países priorizam o crescimento econômico a qualquer custo, sacrificando direitos sociais e ambientais. Outros investem em inclusão social, mas falham na proteção da natureza. E há ainda quem sustente um discurso verde impecável — enquanto mantém práticas que desmatam, poluem ou exploram recursos além do limite.

O resultado é um desequilíbrio estrutural: um tripé com uma perna fortalecida (a econômica), outra cambaleante (a social), e uma terceira pintada de verde (ambiental) ainda serve mais como uma bengala do que como pilar.

Economia como fair play… e como impedimento

Curiosamente, o comércio internacional é um dos poucos campos onde adversários ideológicos ainda dialogam — ainda que entre uma rusga e um arranca-rabo. A economia procura jogar com as regras do fair play diplomático: dá pra vender gás a quem te critica ou importar minério de quem censura jornalistas — desde que o preço compense.

Mas essa mesma bola pode ser chutada para fora do campo quando convém — e os jogadores, como bons gandulas, tentam repor a bola e o jogo segue. Ultimamente, o técnico dos EUA mudou as regras para o beisebol — enquanto os outros países ainda estavam jogando futebol. Talvez em busca de um inusitado home run* solo, onde ele mesmo lança a bola e, ao mesmo tempo, rebate…

E as medidas se multiplicam: embargos, tarifas, boicotes e chantagens comerciais — quase sempre apresentadas como punições políticas disfarçadas (ou nem tanto). E lá se vai o ganha-ganha, substituído pelo espírito da campanha de Trump: America First! (Primeiro a América) e o velho e reeditado slogan MAGA (Make America Great Again), Tornar a América Grande Novamente, que, na prática, agora parece soar mais como: o bloco do eu sozinho! Ou seja, Só América!

Mas, do jeito que as bravatas e as sanções reais se confundem, parece mesmo que ele tá jogando é truco.

Parte da torcida vibra, parte vaia. Mas, como no espetáculo que virou a política econômica, seja tragédia ou comédia, o mundo continua tentando driblar — ou suportar — os muitos impedimentos ao estabelecimento pleno do tripé da sustentabilidade.

*(quando o rebatedor acerta a bola com tanta força que ela sai do campo, e todos os jogadores em base correm até o final, pontuando)

Adendo: A política da conveniência – ou como a realpolitik* dança conforme a música

No jogo internacional, a conveniência costuma ser mais importante que a coerência. E não são só os BRICS+ que negociam com regimes questionáveis — os Estados Unidos fazem isso com maestria, embora nem sempre com bons resultados. Às vezes armam países, noutras declaram guerra a eles. A diferença é que os BRICS, ao menos, ainda apontam contradições diplomaticamente — mesmo sem força para mudar o jogo. É como aquele protesto simbólico antes de um jogo de futebol: não resolve, mas mostra que alguém ainda está prestando atenção.

Falando em futebol, o paralelo com o fair play não é gratuito. Torcemos por nossos países nas Copas, mesmo quando o regime político deles está longe do ideal. A regra não escrita é clara: no esporte, como na economia, o jogo só continua se houver algum tipo de fair play mínimo. O problema é que, nos bastidores da diplomacia, o jogo é bruto — e o juiz só apita se for do interesse do patrocinador.

E o Brasil? Bem, estamos acostumados a viver numa democracia em que o povo não apita quase nada. Votamos com a esperança de que nossos representantes legislem por nós — mas o que se vê é um festival de interesses privados, bancadas disfarçadas de causas nobres e amigos dos amigos em todas as esferas. Desculpem os gatos, mas o saco — de gatos — tá cheio.

Vide o destino da grana das emendas parlamentares: enquanto municípios carentes seguem à míngua, muitas vezes os recursos são direcionados a cidades que já andam com as próprias pernas — isso quando não somem em desvios, licitações criativas ou obras que só existem no papel. É só pesquisar.

*Realpolitik: termo cunhado na Alemanha do século XIX, significa literalmente política realista. Define uma estratégia baseada em conveniência, pragmatismo e cálculo de poder — mesmo que isso implique ignorar valores democráticos, direitos humanos ou princípios éticos, se eles atrapalharem os objetivos traçados.

Faltas silenciosas e arquibancadas desiguais

Na grande Copa diplomática global, nem todos têm a mesma chance de entrar em campo.
Sanções econômicas, bloqueios comerciais e restrições financeiras — muitas vezes disfarçadas de medidas técnicas — funcionam como faltas silenciosas: derrubam economias, bloqueiam investimentos, dificultam o acesso a tecnologias verdes e a crédito internacional.
Daí os BRICS?

Nesse jogo, quem define as regras nem sempre joga limpo.
O resultado? Uma sustentabilidade desigual, onde nem todos pisam no mesmo gramado — e os juízes, quase nunca, são neutros.
Daí os BRICS?

Então, frente à arquibancada global onde parte da torcida nem sequer pode assistir ao jogo…
Daí os BRICS?

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Tijolo rachado com circuito eletrônico e QR Code, de onde brota uma planta verde. A imagem simboliza o contraste entre tecnologia e natureza, sugerindo resiliência ecológica e futuro sustentável no contexto dos BRICS+.
Em meio a uns rachos, tecnologias, economia, a natureza ainda vinga!, dizem que até se vinga, mas na verdade ela apenas é persistente ao chamado do que denominamos vida!
ilustração: Athena&PLW [colagens digitais]

BRICS+ no social, no ambiental e os parceiros atuam onde?

A pegada ambiental e as emissões de carbono

Juntos, os países do BRICS+ somam mais da metade da população mundial , 53%  e PIB 35% — e concentram uma fatia expressiva das emissões globais de carbono 45%.
Nas emissões, China e Índia lideram o ranking absoluto, seguidas por Rússia e Brasil. Esses e outros dados estão relacionados numa TABELA no Lado A dessa bolacha em texto: (clique aqui e vá direto na TABELA !

Ainda assim, o bloco abriga algumas das maiores reservas ambientais do planeta: da floresta amazônica às bacias hidrográficas africanas, passando por manguezais, zonas costeiras e ecossistemas tropicais de alto valor estratégico.

Essa dualidade — entre causar e mitigar os impactos ambientais — expõe o paradoxo central: os BRICS+ são, ao mesmo tempo, parte significativa do problema e peças-chave da solução. Se o grupo não encontrar um equilíbrio na própria pegada ambiental, o tropeço será coletivo. E o custo, global. Daí a pressão sobre o Brasil na agenda ambiental não ser apenas regional — é mundial.

Direitos humanos: a nota dissonante

Sustentabilidade sem direitos humanos é uma canção desafinada, um andar cheio de tropeços — ou mesmo uma bela construção arquitetônica, sempre vazia. Ignorados os direitos humanos, é ignorar o social. E o social, por sua vez, são as pessoas. E as pessoas somos nós — eu e você. (Vamos deixar as polêmicas e distorções sobre os direitos humanos para outra peleja, que tal numa partida de xadrez? Um amigo tem uma música ideal para isso. Aguardem.)
Boa parte dos membros do BRICS+ enfrenta críticas severas por repressão à imprensa, perseguição a opositores, restrições à liberdade de expressão e violações sistemáticas de direitos civis.

Mas antes da (in)dignação seletiva com os problemas do Sul Global, vale lembrar: o Norte Global também não está isento desses perrengues. Os graus, as situações e as circunstâncias podem ser diferentes — mas a (in)dignação, ou a falta dela, revela muito sobre nossas escolhas. E deveria (in)dignar, sim, em todos os casos.

Essas fragilidades não comprometem apenas a perna social do tripé da sustentabilidade. Comprometem também a governança ambiental.
Onde não há transparência, é difícil medir avanços.
Onde não há participação social, os discursos verdes podem virar apenas cortinas de fumaça.

Essa participação, aliás, não se resume ao engajamento em partidos ou instituições. Ela começa na prática, no cotidiano. É a soma que multiplica (desculpem, uso como um mantra, tanto soma que multiplica):
Conhece os 5Rs da sustentabilidade? Se não, clique para saber mais e participar dessa soma multiplicadora.
Muita gente acha que essa contribuição é inócua — e é exatamente assim que ela se mantém invisível. Até que a gente junte as pontas

Investir na educação das novas gerações, ser exemplo dentro de casa, mudar práticas do começo ao fim da vida — tudo isso ajuda a alterar ou eliminar o prefixo da palavra que se repetiu insistentemente acima: (in)dignação. O que queremos é tornar nossas ações dignas de atenção — e de consequência, ou seja, ações efetivas, dignas.

Claro, se quiser se engajar formalmente, se filiar, protestar, participar, tudo isso também conta. Faz parte do jogo. E amplia nossas chances de contribuição real para uma causa que se apresenta legítima e que nunca deve — ou deveria — ser considerada perdida.

Por fim, a ausência de uma democracia plena em diversos países do bloco impede que a sustentabilidade se firme como um compromisso verdadeiramente coletivo. Ainda assim, talvez seja melhor colocarmos uma solução comum — mesmo que não totalmente satisfatória — para voar, do que ficarmos com duas ideias na mão.

E os parceiros atuam no econômico, social e ambiental?

A inclusão dos países parceiros amplia o raio de ação do BRICS+, mas também levanta dúvidas sobre sua real participação nos eixos centrais do bloco.

Em geral, esses parceiros atuam mais intensamente na dimensão econômica, sobretudo em comércio, investimentos e cooperação técnica. São países com vocações estratégicas — seja por sua posição geográfica, recursos naturais, ou acordos bilaterais com os membros permanentes.

Na dimensão social, a atuação é mais discreta e desigual. Alguns parceiros, como Cuba e Bolívia, trazem agendas voltadas à saúde, à educação e à soberania alimentar. Outros ainda enfrentam desafios profundos em direitos humanos e inclusão social — e alguns convivem com retrocessos preocupantes.

No pilar ambiental, poucos têm protagonismo visível, embora possuam biomas de relevância planetária — como as florestas da Bacia do Congo (Nigéria e Uganda), ou os ecossistemas costeiros e florestais do Sudeste Asiático (Malásia, Tailândia e Vietnã). Na prática, porém, a cooperação ambiental entre os parceiros ainda é incipiente — muitas vezes mais retórica do que ação concreta.

E há um desafio comum que atravessa vários desses países — inclusive o Brasil: o impacto da mineração predatória, muitas vezes em zonas protegidas, terras indígenas ou áreas de altíssima biodiversidade.

A tensão entre exploração econômica e conservação ambiental continua mal resolvida — quando não deliberadamente silenciada. Ou pior: quando essa exploração assume contornos de uma guerra civil não declarada.

O desafio agora é integrar os parceiros de forma que não apenas ampliem o número de cadeiras, mas também fortaleçam a consistência do tripé. Para que o BRICS+ não seja apenas um grupo mais largo — mas um bloco mais sólido, coerente e compromissado com o futuro do planeta.

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Sul Global em construção: tijolos, trincas e tectônica internacional

Os BRICS como alternativa ao G7?

Desde sua origem, os BRICS — e, mais recentemente, sua versão ampliada com a confirmação em 2023 e a efetivação em 2024 da entrada de novos países — agora chamados BRICS+ — se apresentam como uma força emergente, capaz de contrabalançar o domínio do G7 e das potências ocidentais.

Com países populosos, grandes reservas naturais e forte influência regional, o bloco busca afirmar sua voz nos fóruns multilaterais e propor uma nova arquitetura global.

É como erguer uma nova fundação para a casa comum da humanidade — ao Sul Global, claro.

Por que o Norte Global (G7) se considera a única fundação legítima?

Historicamente, quem define as regras do jogo são os que estavam à mesa quando o jogo começou. O G7 — formado por Estados Unidos, Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Canadá e Japão — reunindo as potências industrializadas que dominaram o cenário geopolítico do pós-guerra: tanto as vencedoras da Segunda Guerra quanto algumas das derrotadas que foram… reconstruídas com esmero. Ah, sim — a União Europeia também participa como convidada permanente, imaginem que não…

(Curiosidade que não é bem segredo): dos sete membros do G7, três perderam a guerra — Alemanha, Itália e Japão — e quatro venceram. Mas todos se sentaram juntos à mesma mesa de negociações um tempo depois. Porque, no fim das contas, quem perdeu a guerra, mas venceu depois — na base da reconstrução suada, da produtividade e do mercado — também foi convidado.

Mas se produtividade e mercado é condição para entrar no clube…

A China, apesar de ser hoje a segunda maior economia do mundo, nunca fez parte do G7. Sua condição de país emergente, sua trajetória própria de desenvolvimento e — vale dizer — suas estratégias nada convencionais.

Primeiro, inundou o mundo com produtos chinglings: baratinhos, cópias de outras marcas, acessíveis para todos os bolsos. Depois, consolidou suas próprias marcas, assumiu outro patamar de competitividade e passou a avançar em áreas estratégicas: inteligência artificial, construção, energia, infraestrutura...

Mas o modelo autoritário de governo, a opacidade institucional e as tensões diplomáticas persistentes nunca combinaram com o figurino ocidental do G7 — onde, ao menos no discurso, liberdade e transparência continuam sendo os valores da fachada.

Já a Rússia chegou a ser incorporada em 1998, transformando o G7 em G8

A Rússia, que por sua vez, havia passado pela fase da glasnost e da perestroika, abriu a economia, desmontou parte do aparato soviético e ensaiou uma integração com o Ocidente. Mesmo com os traços autoritários já visíveis — e que só se intensificaram com Putin — muita gente fingiu não ver. Afinal, a prioridade era outra: manter o arsenal nuclear sob controle, garantir acesso ao petróleo e abrir novos mercados para as potências ocidentais.

Liberdade de imprensa? Oligarquias emergentes? Eleições viciadas? Fica pra depois. O que interessava era que a Rússia tivesse largado a foice, ainda que mantivesse o martelo. Porém passaram a foice na própria Rússia que foi expulsa do G7 em 2014, após a anexação da Crimeia. Entrou pela porta da frente, com pompa e circunstância; saiu pelos fundos, ao som de sanções e condenações diplomáticas. E agora a guerra com a Ucrânia causa uma saia tão justa, na verdade, quase rasgando…

Curiosamente (ou não), foi em 2009 — no intervalo entre a entrada e a saída da Rússia do G8 — que aconteceu a primeira cúpula oficial dos BRICs, ainda sem o S da África do Sul.

Há um zumzumzum que parece gritaria no Norte Global. Sinal de que…

E uma cantilena no Sul Global: a cada novo membro incomoda muita gente, mais dez parceiros incomodam muito mais…
(Ou será que mais membros incomodantes significam mais mudanças inevitáveis muito mais?)

Se a intenção dos BRICS+ é principalmente econômica — e está funcionando —, então eis o motivo da gritaria. O incômodo vem do fato de que esse grupo, antes rotulado como subdesenvolvido ou em desenvolvimento, começa agora a ditar parte do jogo. Se um já deu um salto triplo, o receio é que os outros ganhem impulso suficiente para aterrissar no centro da situação. O que antes era periferia agora negocia como centro emergente — e cada passo na direção da autonomia econômica soa como uma ameaça ao antigo jogo estabelecido.

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Avanços concretos: bancos, obras e cooperação

O Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) — informalmente chamado de Banco dos BRICS

Agora que a sigla NDB pegou, vale lembrar: o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) foi fundado em julho de 2014, durante a 6ª cúpula dos BRICS, realizada em Fortaleza, Brasil.

E como nada é por acaso:

  • Entre 27 de fevereiro e 18 de março de 2014: da ocupação, referendo (não reconhecido internacionalmente) em que a maioria dos votantes teria optado por se unir à Rússia. e tratado formal de anexação da Crimeia.
  • 24 de março de 2014: durante a Cúpula de Segurança Nuclear em Haia, os líderes do G7 anunciam a suspensão da Rússia do grupo. O G8 volta a ser G7 oficialmente.

Ele surgiu como uma alternativa ao Banco Mundial e ao FMI, com foco em financiar projetos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável nos países do bloco — e também em outras economias emergentes.

  • O nome Banco dos BRICS é uma forma popular de se referir ao NDB, mas nunca foi seu nome oficial — embora, na prática, nunca tenha deixado de ser o banco dos BRICS (porque, claro, se pode complicar, pra que simplificar?).
  • A sede do banco fica em Xangai, na China, e ele vem expandindo seus membros. Já admitiu países como Bangladesh, Egito e Emirados Árabes Unidos, com a Indonésia ainda em negociações antes de se tornar membro pleno do BRICS em 2025.
  • Desde 2023, a presidência do NDB é ocupada pela ex-presidenta brasileira Dilma Rousseff, o que reforça o papel do Brasil no bloco — e também gera debates internos sobre protagonismo e alinhamento.

Argentina e os BRICS

  • A Argentina tem buscado há anos integrar os BRICS. Sua economia, apesar de instável, é estrategicamente relevante na América do Sul, e a afinidade política com países como Brasil, China e Rússia tem favorecido essa aproximação.
  • Em 2023, o convite para a entrada no BRICS foi aprovado, mas a troca de governo em 2024, com a vitória de Javier Milei, interrompeu o processo, já que o novo presidente rejeitou a adesão, alegando alinhamento com os Estados Unidos e Israel.
  • Mesmo assim, a Argentina continua atuando como parceira de diálogo, especialmente em áreas como energia e comércio agrícola.

Indonésia como membro efetivo

  • A Indonésia participou por vários anos como observadora e parceira nos fóruns do BRICS, o que indica que a nova categoria de parceiros pode funcionar como um estágio preparatório para a entrada no bloco — quase como um pleito por aproximação e compromissos.
  • Em 2025, foi oficialmente confirmada como membro pleno, ampliando o grupo para 11 integrantes efetivos.
  • Sua inclusão reforça o papel estratégico do Sudeste Asiático no novo eixo multipolar — com a Indonésia se destacando como potência regional e o país muçulmano mais populoso do mundo.

Adendo sobre a Arábia Saudita – está, mas não está?

Embora listada como membro pleno desde 2024, a Arábia Saudita ainda não confirmou sua adesão formal ao bloco — um movimento cauteloso para preservar seus laços com os EUA. No Rio, o príncipe herdeiro ou sua comitiva não participaram da sessão plenária inicial nem da foto oficial, justamente porque chegaram depois — o que reforça a ideia de uma integração ainda em construção

Parte da comitiva saudita participou de reuniões subsequentes, incluindo um encontro com o Brasil para fechar acordos comerciais na cúpula. O príncipe Mohammed bin Salman tem boa relação com Donald Trump — e isso pode ter influenciado a posição hesitante do reino, que aparece dividido entre estreitar laços com a China e preservar sua relação com os EUA no curto prazo.

Mas há rachaduras visíveis nas paredes do projeto

Nem tudo está bem estruturado. Choques entre autocracias e democracias geram tensões silenciosas.
As prioridades econômicas e ambientais divergem. Disputas por protagonismo — especialmente entre China e Índia — se tornam mais visíveis à medida que o bloco cresce.
A tectônica geopolítica faz o chão tremer em alguns pontos, revelando as trincas de um projeto ainda em obras.
O risco? Tentar erguer um novo andar antes de reforçar os alicerces — e descobrir tarde demais que a parede era só de drywall geopolítico.

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Conclusão

Tijolos, bloquinhos de montar e contradições

O BRICS+, ampliado, já não é apenas um acrônimo simpático — é um conjunto em mutação, tentando se tornar um bloco político, econômico e, quem sabe, climático. Mas, a cada novo integrante, surgem novas dissonâncias. Em vez de uma parede sólida, temos, por ora, um mosaico de blocos de montar geoestratégicos: coloridos, intrigantes — mas ainda instáveis.

Há potência, sem dúvida. Mas também fissuras, jogos de interesse, silêncios protocolados e empurrões nos bastidores. Ainda assim, há gentilezas, sorrisos diplomáticos e boa vontade política.

O verde como cimento possível

E se a sustentabilidade for justamente o cimento que falta?
O tripé ambiental-social-econômico pode ser o ponto de convergência para um grupo tão diverso em regimes, culturas e projetos de mundo? Este, claro seria um cenário ideal, difícil de se tornar… concreto.
Preservar florestas, proteger comunidades vulneráveis, construir economias de baixo carbono — talvez aí esteja o verdadeiro tijolo mestre que se mostre vivo.

Quem planta ideias colhe conexão?

Porque mesmo num planeta Thick as a Brick — cabeça dura como um tijolo — ainda dá pra abrir janelas, plantar ideias e colher conexões. Não sabemos ainda, mas acredito ser um possível caminho para soma se tornar multiplicação.
E quem sabe, com sorte, engenho e afeto, a gente concretamente troque o concreto armado por um verde mais vivo — e mais justo.

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